Cientistas americanos dão mais um passo para criação de vacina da gripe universal
Estudo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e do Instituto Ragon, nos Estados Unidos, foca em um segmento do vírus que raramente sofre mutações
Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e do Instituto Ragon, nos Estados Unidos, estão trabalhando em estratégias para desenvolver uma vacina universal contra a gripe. Em um artigo publicado nesta quarta-feira (7) no Cell Systems, os cientistas descrevem um imunizante que desencadeia uma resposta imune contra um segmento de proteína do vírus da gripe que raramente sofre mutação.
“O motivo de estarmos entusiasmados com esse trabalho é que é um pequeno passo em direção ao desenvolvimento de uma vacina contra a gripe que você tomará apenas uma ou algumas vezes”, afirmou Arup K. Chakraborty, coautor da pesquisa, em declaração à imprensa. “A resposta de anticorpos resultante provavelmente protegerá contra cepas de gripe sazonal e cepas pandêmicas também.”
Como funciona
A maior parte das vacinas contra a gripe consiste em vírus inativados. Esses microrganismos, por sua vez, são revestidos por uma proteína chamada hemaglutinina (HA), que os ajuda a se ligarem às células hospedeiras. Após a vacinação, o sistema imunológico gera anticorpos que têm como alvo a “cabeça” da HA, a parte da proteína que sofre mutação mais rapidamente.
Em seu novo estudo, contudo, os cientistas focaram no “caule” da HA, pois essa região sofre muito menos mutações do que o topo. Por isso, o intuito deles era justamente desenvolver uma vacina que gerasse anticorpos neutralizantes contra essa parte mais estável da proteína.
O grupo desenvolveu um modelo computacional para explorar ainda mais a “imunodominância” da região da cabeça da proteína. “Nossa hipótese é que a geometria da superfície do vírus pode ser a chave para sua capacidade de sobreviver, protegendo suas partes vulneráveis de anticorpos”, explicou Assaf Amitai, líder da pesquisa.
Para isso, os estudiosos analisaram os efeitos da geometria na imunodominância usando uma técnica chamada simulação de dinâmica molecular. Além disso, eles modelaram um processo chamado maturação de afinidade do anticorpo, que ocorre após as células B encontrarem um vírus (ou vacina) e determinarem quais anticorpos predominarão durante a resposta imune.
Isso porque toda célula B tem receptores em sua superfície que se ligam a diferentes proteínas estranhas. Uma vez que um determinado receptor se conecta fortemente à proteína HA, essa célula B é ativada e começa a se multiplicar rapidamente. Esse processo, então, introduz novas mutações nos receptores das células B, algumas das quais se ligam mais fortemente às proteínas e têm mais chances de sobreviver.
Alguns dias depois, há uma população de células B muito eficiente em se ligar fortemente e em secretar anticorpos contra a proteína HA. “Com o passar do tempo, após a infecção, os anticorpos ficam cada vez melhores no direcionamento desse antígeno específico”, disse Chakraborty.
Simulações
Os modelos de computador desse processo revelaram que, quando uma vacina contra a gripe é administrada, os receptores de células B que se ligam ao caule HA ficam em desvantagem competitiva durante o processo de maturação. Isso acontece pois, como explicam os especialistas, os receptores não conseguem atingir seus alvos tão facilmente quanto aqueles outros receptores celulares mais “maduros” que se ligam fortemente à cabeça da HA.
Eles também simularam esse processo de maturação com uma vacina de nanopartículas com proteínas-tronco HA desenvolvida pelos Institutos Nacionais da Saúde dos EUA que agora está passando por ensaios clínicos. Segundo os pesquisadores, o modelo mostrou que esse arranjo torna as proteínas mais acessíveis aos anticorpos, que têm forma de Y, pois os permitem se agarrar às proteínas com os dois “braços”. As simulações também revelaram que os anticorpos direcionados à haste predominaram no final do processo de maturação.
Por fim, os cientistas usaram o modelo computacional para prever o resultado de várias estratégias de vacinação possíveis. Dentre elas, uma que parece promissora é imunizar com uma HA derivada de um vírus que é semelhante, mas não o mesmo, cepas às quais o receptor foi exposto anteriormente.
Usando camundongos com células do sistema imunológico humano, os pesquisadores testaram essa estratégia, primeiro imunizando-os contra a cepa H1N1 de 2009, seguida por uma vacina de nanopartículas contendo a proteína-tronco HA de uma cepa diferente do vírus. Eles descobriram que essa abordagem foi muito mais bem-sucedida em induzir a produção de anticorpos neutralizantes do que qualquer uma das outras estratégias testadas.
“Descobrimos que esse evento específico em nossa história imunológica [infecção e vacinação contra o H1N1] pode realmente ser aproveitado com essa nanopartícula em particular para reorientar a atenção do sistema imunológico em um desses alvos de vacinas universais”, afirmou o coautor Daniel Lingwood. “Quando há um evento de reorientação, isso significa que podemos balançar a resposta do anticorpo contra esse alvo, o que em outras condições simplesmente não é visto. Mostramos em estudos anteriores que, quando você é capaz de provocar esse tipo de resposta, protegendocontra cepas de gripe que são potenciais ameaças de pandemia.”
Revista Galileu